Habilidades Auditivas das crianças com Síndrome Congênita do Zika Vírus
Infecção por Zika vírus, Transtornos da Audição, Desenvolvimento Infantil, Fatores de Risco, Testes Auditivos.
Apesar do crescente esforço da comunidade cientifica em caracterizar as alterações auditivas decorrentes da Síndrome Congênita do ZIKV (SCZV), ainda são escassos estudos sobre o desenvolvimento das habilidades auditivas dessas crianças, sendo que a maioria dos estudos na área priorizam a avaliação da perda auditiva, desconsiderando aspectos comportamentais. Parte da dificuldade de avaliar as habilidades auditivas nos primeiros anos de vida está relacionada à carência de instrumentos formais, factíveis e rápidos para identificação de alterações tão complexas em crianças pequenas. Sendo assim, este trabalho investigou a prevalência de alteração das habilidades auditivas e os possíveis fatores sociais, ambientais e biológicos associados à essas alterações. Inicialmente, realizou-se uma revisão não-sistemática da literatura acerca da disponibilidade de instrumentos de identificação de alteração/atraso do desenvolvimento das habilidades auditivas em bebês. Observou-se que a Escala Bayley de Desenvolvimento Infantil III, na parte do domínio de linguagem receptiva, apresentou provas de avaliação próximas das recomendadas pelo exame padrão ouro de avaliação das habilidades auditivas. Seguiu-se então com o estudo transversal com 144 crianças com SCZV participantes do projeto Desenvolvimento Infantil na Comunidade (DICa), estimando as prevalências de alterações nas habilidades de: atenção, localização, discriminação e reconhecimento sonoro, a partir da utilização das provas dispostas na subescala linguagem receptiva na Escala Bayley III. Encontrou-se que as crianças com SCZV apresentaram prevalência de 63,9% de alteração na habilidade auditiva de reconhecimento, também foi observado que a aquisição das habilidades mais complexas estava mais comprometida, revelando um possível atraso no desenvolvimento da função auditiva dessas crianças. Observou-se associação entre alteração de habilidades auditivas com menor escolaridade materna, e inadequada organização ambiente familiar e disponibilidade de brinquedos. Além disso, encontrou-se que, dentre as alterações neuroanatômicas mais frequentes
na SCZV, a ventriculomegalia apresentou associações mais fortes com a ocorrência de alterações das habilidades auditivas. Por fim, considerando que experiências auditivas têm papel importante no desenvolvimento infantil, os resultados desse estudo reforçam a importância e necessidade de políticas públicas voltadas para identificação precoce e monitoramento do desenvolvimento da função auditiva das crianças com SCZV, sobretudo na atenção básica, uma vez que nesses espaços a possibilidade de aproximação dos profissionais de saúde, família e criança favorece a implementação de ações e estratégias de estimulação, especialmente no ambiente domiciliar.