FUNÇÕES ECOLÓGICAS DE POLIQUETAS (ANNELIDA; POLYCHAETA) AO LONGO DE ESTUÁRIOS TROPICAIS
Funcionamento ecossitêmico, Traços funcionais, Estuário, Macroinvertebrados.
As funções ecológicas são importantes para manutenção dos ecossistemas e podem ser
definidas como os papéis desempenhados pelos organismos no ambiente. A abordagem
funcional permite um melhor entendimento da influência dos organismos sobre o
funcionamento dos ecossistemas em relação a outras abordagens (e.g. classificação
taxônomica). As funções podem ser estudadas através dos traços funcionais dos
indivíduos e as propriedades do ecossistema (e.g. resiliência) dependem da distribuição
e abundância destes no tempo e no espaço. Contudo, diversos estudos têm utilizado
todos os traços e que não necessariamente estão associados a funções. Muitos estudos
realizados em ecossistemas estuarinos investigam a distribuição de táxons da
macrofauna bentônica e os padrões espaciais e/ou temporais. Entretanto, ainda é pouco
conhecida a distribuição das funções desempenhadas pela macrofauna ao longo deste
sistema. No presente trabalho, nossa hipótese é de que a composição funcional da
macrofauna bentônica não se altere significativamente ao longo dos gradientes e em
diferentes períodos, embora a composição taxonômica mude, uma vez que diferentes
táxons podem apresentar conjuntos de características similares para realizar uma mesma
função. Foi utilizado um lote de dados dos 3 principais estuários da Baía de Todos os
Santos (Jaguaripe, Paraguaçu e Subaé) ao longo de 10 ou 11 estações, amostrados em
pelo menos em 4 períodos diferentes. Primeiramente, foram levantadas as funções
ecológicas importantes para os ambientes estuarinos e estabelecidas combinações de
traços funcionais, diretamente relacionadas a funções ecológicas específicas.
Posteriormente, foram testadas potenciais diferenças na distribuição das funções entre
as zonas de salinidade dos estuários e ao longo dos anos. As funções ecológicas
consideradas importantes para os estuários foram bioturbação, fragmentação da matéria
orgânica, estabilização do sedimento, ciclagem de nutrientes e produção secundária. Um
total de 11 categorias de traços foram utilizadas para descrever as funções ecológicas,
incluindo: mobilidade, tipo de movimento, modo de alimentação, aparato utilizado para
entrega de alimento, presença de mandíbula, compartimento sedimentar, tamanho
corporal, modo de reprodução, idade da primeira reprodução, expectativa de vida e taxa
de fecundidade. De maneira geral foi identificado redundância funcional para os traços
associados a bioturbação do sedimento e ciclagem de nutrientes nas regiões mais
marinhas com característica de grãos mais finos enquanto que nas regiões a montante
dos estuários com presença de sedimento de grãos mais grossos foi identificado
principalmente traços associados a função de fragmentação da matéria orgânica. A
abundância de organismos com traços associados a estabilização de sedimentos foi
muito baixa e os conjuntos de características associadas à produção secundária parecem
aumentar à medida que a salinidade diminui. Nem todas as funções se mantiveram ao
longo do gradiente estuarino, devido a ausência de poliquetas com traços similares
capazes de compensar a perda de táxons em determinadas regiões. As funções
desempenhadas pelos poliquetas apresentaram diferenças entre as zonas de salinidade
do estuário (estuário Jaguaripe), assim como para interação entre os anos de coleta e as
zonas de salinidade (estuário Paraguaçu), e diferenças também entre os anos (estuário
do Subaé). Os resultados desse estudo contribuem para compreender o funcionamento e
manejo dos ecossistemas estuarinos. Estudos empíricos que testem a relação dos traços
funcionais descritos com as funções ecológicas mencionadas devem ser realizados para
que seja possível medir o real potencial dos traços funcionais dos organismos no
funcionamento dos ecossistemas.