Distúrbio de Voz Relacionado ao Trabalho em professores: análise das condições ocupacionais e intervenções protetoras
Saúde do trabalhador; Voz; Docentes
As transformações no mundo do trabalho têm intensificado a precarização da docência, marcada por flexibilização contratual, sobrecarga e violência institucional, com impacto direto sobre a saúde vocal e mental dos professores. Esta dissertação analisou, sob uma perspectiva crítica e intersetorial, as relações entre ambiente escolar, violência, sobrecarga de trabalho e o desenvolvimento do Distúrbio de Voz Relacionado ao Trabalho (DVRT) e Transtornos Mentais Comuns (TMC) em docentes da rede pública. Utilizando metodologia híbrida, foram desenvolvidos três estudos: (1) inquérito transversal com 77 professores, que revelou alta prevalência de TMC (51%) e sintomas vocais (88%), associando esses agravos à violência escolar e à sobrecarga de trabalho, com a violência figurando como principal preditor estatístico de DVRT e TMC; (2) revisão de escopo com meta-análise de 19 estudos internacionais, que demonstrou que a amplificação vocal (AV) e a hidratação direta (HD) reduzem significativamente o Índice de Desvantagem Vocal (IDV), a dose vocal e a percepção de esforço; e (3) ensaio clínico quase-experimental, conduzido em três escolas públicas da Bahia, que evidenciou melhora significativa na qualidade vocal e na autopercepção vocal dos professores após quatro semanas de uso de AV e HD, com destaque para maior impacto da AV em parâmetros acústicos e perceptivo-auditivos.
A condução das intervenções no ambiente escolar, e não em condições clínicas, ampliou a aplicabilidade dos achados às rotinas docentes, considerando fatores contextuais como ruído, carga horária e estrutura física. Essa inserção favoreceu a adesão dos participantes, aproximou os campos da saúde e da educação e conferiu visibilidade à voz como temática da saúde do trabalhador. Os resultados demonstram que, embora AV e HD apresentem benefícios, sua efetividade depende das condições organizacionais do trabalho, revelando os limites das ações individuais frente à precarização e flexibilização da docência.
Os resultados desta dissertação apontam que a violência escolar é fator estruturante no processo de adoecimento vocal e mental docente, e que intervenções como AV e HD — ainda que benéficas e de baixo custo — precisam ser articuladas a transformações institucionais mais amplas, que enfrentem os determinantes sociais e organizacionais do trabalho. Conclui-se que intervenções individuais e coletivas devem ser pensadas de forma concomitante e sustentadas por políticas públicas consistentes, capazes de garantir condições reais de saúde e dignidade no exercício da docência.