Por uma abordagem antropológica da hanseníase entre usuários e profissionais de saúde
Hanseníase; Etnografia; Antropologia da Saúde
Há décadas o Brasil vive em meio a debates e ações destinados à erradicação da hanseníase. Sua configuração como problema de saúde pública decorre da sua magnitude e transcendência, e das sequelas irreversíveis quando o diagnóstico é feito tardiamente. Esta realidade desvela os limites da prática biomédica, quando não considera que o processo de adoecimento por hanseníase, a adesão ao tratamento e autocuidado precisa reconhecer a virtualidade do saber leigo/nativo, na constituição das suas formas de significar sinais, sintomas, necessidades de tratamento, cuidado e vida. Sob a perspectiva antropológica, busca-se conhecer os signos e significados construídos e partilhados em dois contextos culturais distintos. Estes são representados por promotores da saúde e por pessoas afetadas pela hanseníase referente ao processo de adoecimento e sua busca ou não pelo tratamento e autocuidado, no município de Laranjeiras. Como ferramenta metodológica, foi utilizada a etnografia. Os dados foram coletados de julho a novembro de 2019. Além da imersão no campo, houve registros no diário de campo, possibilitando uma descrição densa da realidade. No contexto das oficinas realizada pelos promotores da saúde, o saber biomédico era hegemônico na condução das políticas públicas no controle da hanseníase. O mapeamento estatístico da hanseníase, a partir de símbolos interligados, sustentava esta racionalidade que se institucionalizava por meio de protocolos assistenciais, com ênfase na transmissibilidade, diagnóstico, tratamento medicamentoso, associada a problematização de ideias vinculadas ao pecado e a segregação. O segundo contexto cultural analisado desvelou uma pluralidade de conceitos e formas de convívio com a hanseníase pela comunidade de Laranjeiras, que podem ou não se contrapor aos conceitos biomédicos. Revelaram ainda elementos que entrecruzam corpos, bacilos, classificações, tratamento e cuidado, mas, sobretudo a experiência singular das pessoas que foram afetadas pela hanseníase. Esta compreensão demonstra a existência de um choque cultural desses dois contextos, o que impossibilita uma ação efetiva no controle da hanseníase. A cosmovisão de promotores de saúde e da comunidade precisam de interlocução a fim de nortear as ações em saúde, para que estas sejam mais efetivas no controle da hanseníase.