PROCESSOS DE CUIDADO NO PROGRAMA BRINCANDO EM FAMÍLIA: UMA CIRANDA ENTRE CRIANÇAS, FAMILIARES E EQUIPE
Cuidado. Saúde mental infantil. Tripé ensino, pesquisa e extensão. Vínculos familiares. Psicanálise. Atenção psicossocial
O presente estudo se situa dentro da discussão sobre práticas de saúde mental infantil no âmbito do Sistema Único de Saúde e de projetos universitários, considerando as contribuições da psicanálise e a formação de psicólogas para esse trabalho. Foi realizada uma revisão não sistemática da literatura brasileira sobre o tema e os achados indicam quão recentes são as políticas públicas na área, muitas vezes havendo despreparo dos profissionais para atuar na lógica da atenção psicossocial, resquícios do modelo biomédico, lacunas assistenciais na rede e pouca visibilidade quanto ao cuidado de quem cuida, de forma que se faz necessário consolidar modos potentes de intervenção. Tendo isso em vista, optamos por investigar o campo do Brincando em Família (BF), um programa de ensino, pesquisa e extensão vinculado à Universidade Federal da Bahia. O BF se propõe a recuperar e promover saúde mental infantil, principalmente através do trabalho com grupos que reúnem crianças, seus responsáveis e uma equipe de acolhedoras (psicólogas e estudantes de Psicologia). Ademais, recorremos às formulações do autor Luís Claudio Figueiredo e, em diálogo com a psicanálise, consideramos o cuidado como um processo gerador de sentido, que se dá na intersubjetividade através da presença em reserva e da presença implicada nas dimensões: Sustentar e conter; Reconhecer; Interpelar e reclamar. Para caracterizar tal fenômeno, o estudo de caso em questão se debruça sobre o BF por meio de 03 entradas no campo: observação participante das supervisões de equipe, entrevistas semiestruturadas com 08 acolhedoras e leitura dos relatos escritos a partir dos atendimentos. Logo, todo acesso ao programa ocorreu por intermédio da equipe, o que provocou também um olhar sobre a concomitância entre a produção das atividades de cuidado e a produção da subjetividade das acolhedoras, processo denominado de coprodução por Gastão Wagner Campos. Em decorrência da análise temática dos dados, foram elaborados, portanto, três capítulos de resultados e discussão. O primeiro aborda a formação em Psicologia, notando a como um percurso em constante construção que precisa fazer sentido para quem o vive. O segundo traz à tona a experiência das acolhedoras, apresentando, dentre outros pontos, a supervisão clínico-institucional como um espaço fecundo para aprender e cuidar. E o terceiro, por sua vez, identifica algumas práticas de cuidado que o programa tem desenvolvido junto às famílias no contexto da pandemia do Covid-19, nas quais se destacam a presença do brincar como recurso terapêutico a partir de D. Winnicott, o fomento à comunicação dos afetos seguindo a proposta de F. Dolto, a clínica da continência no suporte às famílias segundo W. Bion, o fortalecimento dos vínculos na perspectiva de P. Benghozi, entre outras. Percebemos, por fim, a importância das pontes entre teoria e prática promovidas pelos programas universitários que reúnem o tripé do ensino, pesquisa e extensão e esperamos que o estudo em questão colabore para o desenvolvimento de tais programas. Para futuras pesquisas, seria interessante que investigassem mais as possibilidades de acompanhamento psicossocial para crianças em formatos grupais que incluam as famílias, em instituições diversas como serviços do SUS e das universidades, a fim de continuar a discussão sobre os modos de intervenções possíveis e oportunos.