Práticas discursivas de aconselhamento na Testagem Rápida para HIV em grandes eventos na cidade de Salvador-Bahia: um olhar para o racial
Aconselhamento, TR-HIV/aids, racismo institucional, relações raciais
A presente tese analisa as práticas discursivas com enfoque nos marcadores raciais presentes no aconselhamento durante a testagem para HIV no Carnaval em Salvador-Bahia. Utilizando a perspectiva da Psicologia Social, de base construcionista, o intuito foi de refletir sobre o aconselhamento inserido na Testagem Rápida para HIV (TR-HIV), enfatizando a dimensão racial da população que buscava esse serviço. A tese está organizada em formato de artigo e para compor o todo da tese, discuto teórico-politicamente a noção de aconselhamento como um primeiro tópico para contextualizar o objeto de estudo, além das contribuições dos estudos construcionistas para pensar o objeto de estudo. No primeiro artigo, realizei uma análise documental dos manuais de aconselhamento disponibilizados aos/às profissionais ao longo do tempo em que foi introduzida a prática do aconselhamento na testagem para o HIV. No segundo artigo, está a análise das gravações de aconselhamentos e do diário de campo realizados durante o carnaval de 2019, enfatizando a dimensão racial. O terceiro artigo versa sobre propostas para construção de um aconselhamento racialmente orientado. Os resultados da análise, no primeiro artigo, demonstram uma mudança significativa ao longo do tempo e de cada manual, passando de uma orientação de prevenção mais individualista, ampliando para a prevenção pautada na vulnerabilidade individual e social e, atualmente, sendo orientada, adaptada à vivência das populações-chave para se realizar o aconselhamento. Somente no terceiro manual, a população negra aparece como segmento de atenção no aconselhamento - depois de vinte e um anos da primeira publicação sobre o tema. No segundo, artigo, podemos destacar que os homens autodeclarados negros em situações de vulnerabilidade relatam a oferta sexual e a obrigatoriedade de responder a essa oferta. Paradoxalmente, quando eles têm poucas parceiras na vida também justificam essa situação, com um tom envergonhado, por não corresponder à expectativa de ter muitas parcerias sexuais. Por sua vez, as mulheres negras apresentam essas duas formas vulnerabilidade social, que elevam a exposição ao HIV, quando explicitam durante o aconselhamento, vivência de relacionamentos violentos, sem possibilidade de negociação do uso de meios de prevenção e a dificuldade de acesso aos serviços de testagem e aconselhamentos no seu cotidiano. No terceiro artigo, foi construída uma proposta de aconselhamento para TR-HIV com ênfase nos aspectos raciais. Dois documentos de domínio público foram utilizados como norteadores.Mais do que uma proposta fechada sobre o formato das capacitações (que podem incluir apoio matricial, oficinas, reuniões clínicas, entre outros meios) na educação permanente em saúde, as formações dos/as de profissionais de saúde devem enfocar diretamente as relações raciais e o cuidado público em saúde e que problematize o emprego de discursos institucionalizados sobre a sexualidade da população negra (sejam homens ou mulheres). Destaco que a forma como se deu a prática de pesquisa deste projeto, apesar de não ser nova, foi inovadora. Temos poucos estudos em que se grava, de modo espontâneo e sem a presença da pesquisadora, o momento exato em que se dá o tema de estudo deste projeto - o aconselhamento. Desse modo, entendo que o aconselhamento seja uma tecnologia do cuidado potente. Esse espaço, defendo que se reconfigurado para acontecer sem roteiros prévios (mas com letramento racial e interseccional com os demais marcadores sociais) e com o/a profissional munido de uma abertura para acompanhar e estar atento aos repertórios linguísticos dos marcadores raciais dos usuários/as, pode ser efetivo. Ter um efeito mais significativo para as pessoas que realizam testagem, dentro ou fora dos muros das Unidades de Saúde, que inclui em eventos, como é o caso do Carnaval.