PROCESSOS AFETIVO-SEMIÓTICOS DA EXPERIÊNCIA DE TRANSPLANTE PARA PESSOAS COM ÓRGÃOS TRANSPLANTADOS
Palavras-chave: Significações; Transplante; Doenças Crônicas; Ruptura/transição; Recursos
RESUMO
Diante do crescimento da incidência de doenças crônicas, a realidade do transplante de órgãos se configura como um recurso terapêutico para diversos casos, trazendo um percurso com implicações físicas e psicossociais para os pacientes. A partir desta realidade, o objetivo deste estudo consistiu em compreender a experiência pessoal do transplante construída por pessoas com doenças crônicas. Mais especificamente, buscou-se (1) analisar a trajetória do adoecimento, identificando quais eventos se configuram como rupturas para os indivíduos; (2) identificar os processos afetivo-semióticos envolvidos na experiência; (3) compreender o uso de recursos institucionais, interpessoais, simbólicos e pessoais por parte dos participantes diante de situações disruptivas; e (4) identificar os processos imaginativos. O estudo teve como aporte teórico a Psicologia Cultural. Participaram do estudo cinco adultos com idade entre 25 e 54 anos, que haviam realizado o transplante de um ou dois órgãos (rim, fígado, pulmão, coração e pâncreas e rim). Os dados foram construídos com entrevistas narrativas, entrevistas semiestruturadas e questionário sociodemográfico e foram analisados à luz do Modelo de Equifinalidade de Trajetórias e da construção de eixos temáticos a partir dos objetivos, construtos teóricos da Psicologia Cultural e da literatura. Nas trajetórias dos participantes, eventos como diagnóstico, tratamento, entrada na fila de espera e transplante foram percebidos como disruptivos, deles demandando transições com processos de identidade, aprendizagem de novas habilidades e construção de sentidos. Dentre os processos afetivo-semióticos, os participantes significaram os sintomas iniciais e outras condições de adoecimento, além da presença de incertezas e medos. A ideia da finitude se expressa na narrativa diante do contexto da fila de espera para o transplante, além de significações mais otimistas como boas expectativas, e possibilidade de vida. Sobre a vida e o self após o transplante, os participantes apontam, entre outros signos: o retorno à normalidade, a retomada da rotina, a ausência de restrições, o aumento da qualidade de vida e a possibilidade de superação. A pandemia do Coronavírus fez emergir estados afetivos de ansiedade e pânico, além de relatos que apontam a vivência de uma nova quarentena e sobrecarga de demandas. Entre os recursos utilizados nos processos de transição estavam: reflexões a partir de artefatos culturais; as instituições hospitalares, a religião; a família, amigos e características pessoais dos participantes. Nos processos imaginativos, os participantes trazem expectativas acerca do transplante: liberdade, qualidade de vida, retorno à rotina, estar com a família e projetar o futuro. As trajetórias sombras atuaram como signos catalisadores, como contexto para o fortalecimento dos signos promotores, os quais contribuíram para a manutenção das práticas de autocuidado. A imaginação para o futuro aponta a busca pela continuidade de avanços conquistados e busca de ideais pessoais. Ressalta-se a importância de espaços para a expressão da voz de pessoas com doenças crônicas, bem como do aperfeiçoamento na formação de profissionais de saúde.