Reconstrução digital: narrativas virtuais e um novo lugar para a memória
Herança Cultural. Reconstrução Digital. Narrativa Virtual. Documentação Arquitetônica Digital. Paradado.
A evolução das tecnologias digitais e os episódios recentes de destruição de bens da herança cultural estão sendo determinantes para a larga produção de modelos de reconstrução digital de monumentos, sítios e artefatos históricos. Também a própria condição da contemporaneidade, híbrida do material e do digital, tem demandado a digitalização do mundo físico e a construção de modelos digitais aplicáveis aos mais diversos usos. O posicionamento dos órgãos de proteção do patrimônio, muitas vezes, tem encorajado a reconstrução como forma de reafirmação política contra extremistas e de fortalecimento da resiliência das comunidades. Menos polêmica e reversível, a reconstrução digital tem como objetivo representar monumentos e objetos desaparecidos, restaurando-os visualmente a um dado momento da sua história, sendo também amplamente utilizados como documentos científicos na arqueologia virtual, como promoção da divulgação turística e museográfica, bem como forma de resiliência, na superação da perda de um patrimônio destruído. Esta pesquisa parte da hipótese de que o entendimento dos modelos digitais de reconstrução são componentes das narrativas históricas e arqueológicas, construídas por um narrador-modelador que faz escolhas, prioriza aspectos e define a história a ser contada. Desta forma, tem como objetivos compreender e demonstrar a dimensão da reconstrução digital como método e produto digital, bem como propor uma ampliação do conceito de reconstrução digital, na perspectiva da compreensão desta como um processo interpretativo e dependente daquele que a interpreta e cria. Para alcançar estes objetivos, esta tese se propôs a executar um projeto prático de reconstrução digital e elaborar modelos de reconstrução digital das edificações do sítio histórico do Convento de Santo Antônio do Paraguaçu, propondo uma forma de registro e acesso aos paradados e elaborando narrativas virtuais para contemplar as construções teóricas suscitadas. A partir das elaborações propostas, foi possível identificar que existe uma simplificação conceitual da reconstrução digital, uma vez que esta não compreende todos os seus aspectos. Foi evidenciado que uma reconstrução digital decorre de uma série de interpretações e decisões, caracterizando o modelo digital produzido como um objeto cognitivo, síntese de um processo intelectual baseado em referências sobre o objeto físico que representa sendo, ao mesmo tempo, um repositório de conhecimento e síntese deste conhecimento, por trazer consigo o conhecimento de fontes heterogêneas. Não obstante, a importância do registro deste processo intelectual como garantia de transparência e confiabilidade científica, tornou-se um requerimento das instituições de patrimônio, e a despeito do que muitos autores têm proposto, verificou-se a viabilidade de soluções simples destes registros (paradados), uma vez constatado que o cerne desta questão reside mais na postura ética do pesquisador-modelador do que na tecnologia em si. Na conclusão desta pesquisa, verificou-se que as narrativas virtuais elaboradas, servem de arena para a constituição de diferentes versões da história e que estas têm se configurado como o principal suporte de disseminação do patrimônio e do trabalho intelectual investigativo, interpretativo e decisório, que produz o conhecimento, não restringe, mas abre nova possibilidades de interpretação da história.