POLÍTICA AMBIENTAL E REGULAÇÃO URBANA: COBERTURA VEGETAL E DESIGUALDADE SOCIOAMBIENTAL
EM SALVADOR
Política Ambiental. Regulação Urbana. Cobertura Vegetal. Desigualdade Socioambiental.
A crise dos sistemas climáticos é consequência da construção de caminhos equivocados do
modelo de desenvolvimento civilizatório consolidado na sociedade moderna, cuja trajetória se
caracteriza pela relação de conflito entre sociedade e natureza. No âmbito local, o padrão de
distribuição da cobertura vegetal urbana tem um papel essencial de interação sistêmica nos
balanços hídrico e termodinâmico nas cidades, contribuindo para a regulação das distintas
condições microclimáticas intraurbanas, diante da emergente crise ambiental global. Tem-se
como objetivo compreender as implicações da política urbano-ambiental que fundamenta a
regulação urbana, na ampliação, manutenção e retração da distribuição intraurbana da
cobertura vegetal, e como tal condição repercute na desigualdade socioambiental na cidade de
Salvador, no período de 2004 a 2020, além de identificar e propor um parâmetro balizador,
indicador de cobertura vegetal, que possa contribuir para a reestruturação da distribuição
intraurbana da vegetação. Busca-se preencher a lacuna na criação de métricas para a
distribuição intraurbana da vegetação, como aporte ao planejamento urbano no enfrentamento
da desigualdade socioambiental e dos riscos de desastres climáticos no espaço urbano. A
presente pesquisa tem uma abordagem crítica exploratória quali-quantitativa de estudo de
caso. A metodologia utilizada envolve a sistematização dos dados primários em ambiente
GEE (Google Earth Engine), permitindo a análise espaço-temporal da inter-relação entre os
indicadores do Percentual de Cobertura Vegetal (PCV), da Temperatura de Superfície
Terrestre (TST) e da Percepção sobre a Arborização nas ruas pela população (PerARB) por
bairro - a interseção entre as referidas bases de dados espelha o modo como a política urbanoambiental
se instituiu ao longo do período analisado. A pesquisa realizada revela uma
significativa desproporção no padrão de distribuição intraurbana da cobertura vegetal, visto que 66% do total de bairros apresentam PCV inferior a 10%. No cruzamento dos dados do PCV e da TST por bairro, em dois subperíodos de estudo (2005/2012 e 2013/2020), identifica-se que, a partir do patamar do PCV de 32% (ponto limite), a cobertura vegetal passa a contribuir com a atenuação das temperaturas. Apenas 12% do total de bairros da cidade (20 de 163) apresentam valor do PCV de 32% e, em sua quase totalidade, têm uma distribuição interna inadequada. Verifica-se que as regulações urbano-ambientais analisadas tratam genericamente da proteção da vegetação urbana e não incorporam nas instruções parâmetros mínimos que possam contribuir integradamente para a delimitação da quantidade, qualidade e distribuição intraurbana da cobertura vegetal. Assim sendo, as políticas públicas urbanoambientais que incorporam instrumentos de regulação urbana, no âmbito da gestão municipal, no período de 2004 a 2020, em Salvador, têm implicado na construção dos padrões de distribuição da cobertura vegetal, terminando por institucionalizar sua supressão. A
elaboração de diagnósticos para a identificação do “ponto limite” permite a proposição do parâmetro balizador da cobertura vegetal intraurbana em múltiplas escalas, revelando-se um importante instrumento da política ambiental urbana na reestruturação processual e manutenção equitativa da qualidade do ambiente e de vida nas cidades.