História de Portugal de Fernão de Oliveira: edição diplomática e análise dos topônimos em Portugal
Discurso retórico. Topônimos. Fernão de Oliveira. História de Portugal. Língua Portuguesa.
Os estudos relacionados à história da língua, no que se referem aos processos de mudança linguística, apoiam-se evidentemente em registros de textos produzidos no passado por um determinado sujeito ideologicamente constituído em uma comunidade. Dessa forma, a história, além de mostrar a evolução do ser humano e as suas adaptações às tecnologias, também mostra as mudanças impostas quanto às concepções acerca do mundo em que o homem vive e as mudanças por que passam a sua linguagem ao longo dos tempos. Por isso, muitos textos escritos no passado são recuperados pela filologia, através da crítica textual e da linguística histórica, no intuito de preservar material que servirá como testemunho documental e literário, além de possibilitar a observação dos estados de determinadas línguas em diferentes épocas pretéritas (ou diferentes sincronias) e da evolução de determinados fenômenos linguísticos, associados a fatores históricos e socioculturais, na tentativa de interpretar as mudanças ocorridas no passado e as variações existentes em um momento contemporâneo. É em busca dessa história que se propõe aqui a analisar os topônimos portugueses encontrados no texto História de Portugal, escrito pelo humanista Fernão de Oliveira, provavelmente, por volta de 1581, e de como este autor utiliza o discurso retórico a partir do léxico onomástico. Para isso, busca-se o amparo nas orientações teóricas: teoria da enunciação, sob abordagem de Benveniste (2005; 2006), Bakhtin (2003) e Bakhtin [Voloshinov] (2004 [1929]), que colocam o sujeito no centro da reflexão linguística; entender o processo da escrita historiográfica, tendo como parâmetro as regras da retórica clássica, aos moldes da metodologia de Aristóteles (2005 [séc. IV a.C.]), passando pela retórica utilizada na Idade Média a nova retórica ou o tratado da argumentação, de Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005) e Perelman (2004); para o método de análise toponímica, a pesquisa apoia-se no modelo taxonômico de Dick (1990; 1992; 1998; 2007). A coleta e análise dos dados busca responder as seguintes hipóteses: i. A interpretação dos topônimos seria intenção do autor em marcar Portugal no campo da imunidade e primazia perante as outras nações, de modo a convencer o povo, seu principal interlocutor, a lutar por um reino superior às outras nações; ii. As características do gênero do discurso historiográfico teriam influenciado Fernão de Oliveira na construção de sua narrativa, baseado no compromisso com a “verdade”, sempre em discussão desde a Antiguidade Grega, especificamente com Heródoto e Tucídides; iii. A incorporação do mundo bíblico em seu texto, sendo o autor um sujeito humanista, mais voltado às questões do homem, seria uma influência de sua formação eclesiástica ou seria a mentalidade dualista do homem daquele período de transição, imaginado pelo humanismo, cujo comportamento trazia a ambivalência da visão teocêntrica da Idade Média e o antropocentrismo do caráter renascentista. O resultado mostra que Fernão de Oliveira buscou organizar as suas ideias com fins ideológicos, em torno de uma ação política. Para isso, o dominicano construiu seu ethos discursivo relacionado ao momento da enunciação a fim de conduzir o interlocutor por uma narrativa não necessariamente real, mas verossímil.