O desenvolvimento da escrita do português brasileiro por surdos falantes de libras: um estudo à luz da Teoria dos Sistemas Dinâmicos Complexos
libras; PB escrito; surdos brasileiros; TSDC; variáveis individuais.
Nesta Tese em andamento, analiso como e em que medida variáveis individuais (linguísticas e extralinguísticas) militam no desenvolvimento da escrita do português brasileiro – PB por surdos usuários da língua brasileira de sinais – libras, com foco especial na interação entre esses dois sistemas linguísticos. Fundamento minha proposta na Teoria dos Sistemas Dinâmicos Complexos – TSDC (Beckner et al., 2009; Larsen-Freeman, 1997) e na Teoria Baseada no Uso (Bybee, 2016), e tomo emprestada a literatura da área da surdez sobre leitura, cultura e identidade surda. Sabemos que surdos brasileiros tendem a usar a escrita do PB, adotando características gramaticais da libras, num já esperado processo de transferência linguística. Acerca disso, as pesquisas que abordam o fenômeno, geralmente, partem da análise linguística no nível de grupo. Embora grandes grupos de participantes sejam interessantes para a descrição das tendências centrais do desenvolvimento da escrita do PB, eles acabam mascarando as idiossincrasias ou variações individuais dos participantes, revelando apenas os padrões persistentes por toda a população testada. Assim, propostas que foquem o nível desenvolvimental individual, essenciais para que se capturem a não linearidade e a dinâmica do fenômeno, e propostas qualitativas, também devem ser conduzidas. Nessa esteira, tendo em vista que defendo aqui a língua como um sistema dinâmico e complexo, por meio do qual vários sistemas se inter-relacionam, sendo resultado de experiências, interações sociais e mecanismos cognitivos de seus usuários, partirei para uma análise das diferenças individuais do fenômeno. Diante disso, então, na pesquisa, analiso de que maneira variáveis individuais atuam no processo de desenvolvimento do PB escrito por surdos e nos níveis de transferência linguística. O estudo tem caráter quase-experimental e não visa analisar os dados apenas de forma quantitativa, sendo que as trajetórias de desenvolvimento individuais são analisadas qualitativamente. Devem participar da pesquisa, idealmente, vinte surdos usuários de libras, sendo dez homens e dez mulheres, que residam nas cidades baianas de Vitória da Conquista, Itabuna e Jaguaquara, mas surdos residentes fora da Bahia também podem ser considerados. Além de entrevista-conversa com os participantes, mediante um questionário semiestruturado, que dará lugar a biografias individuais, o estudo conta com produção eliciada da libras e da escrita do PB, por meio de cinco tarefas linguísticas (em libras: fluência verbal, amplitude vocabular/compreensão textual; em PB escrito: leitura/compreensão textual, fluência verbal e produção textual). Como variáveis individuais, a pesquisa considera o grau e o tipo da surdez; o onset do contato com a libras e do contado com o PB; a língua dominante e a escolaridade do núcleo familiar; a frequência de contato com a língua-alvo; a integração à cultura e à comunidade surda; o uso de leitura labial; o uso de escrita de língua de sinais; a intenção de uso (comunicativo e social) da língua-alvo e a competência leitora na língua-alvo. Desse modo, esta Tese deseja evidenciar que a interação libras-PB também está relacionada à militância de variáveis extralinguísticas, motivo pelo qual a TSDC é adotada como âncora teórica, o que pode revelar, portanto, novas nuances pertinentes ao processo de desenvolvimento da escrita do PB por surdos.